Nova diplomacia

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No discurso de 22 de setembro, na abertura da 75ª Assembleia-Geral da Organização das Nações Unidas, em Nova Iorque, Bolsonaro divulgou realidade paralela, pousou como injustiçado e pintou seus resultados como frutos do mero acaso. Afirmou que é vítima de campanha de desinformação e defendeu as políticas de seu governo diante da pandemia do coronavírus e das queimadas que devastam o Pantanal e a Amazônia. Ciente de sua péssima imagem internacional, resolveu acusar os outros, e quase não mencionou os mais de 140 mil brasileiros mortos pela covid-19.

As inverdades no discurso de Bolsonaro, no palco mais importante da comunidade internacional, ignorou estudos internacionais sobre preservação ambiental no Brasil. Afirmou o desplante, sem base em informações oficiais, que caboclos do mato e índios são os responsáveis pelas queimadas nas florestas, embora se saiba que a Polícia Federal concluiu que os verdadeiros culpados são os fazendeiros, mandantes e autores dos incêndios criminosos. Transferiu ao Judiciário a responsabilidade pelo que se deixou de fazer na pandemia, afirmou haver, por parte da imprensa brasileira, uma campanha brutal de desinformação que dissemina pânico entre a população.

Repetiu seu discurso contrário ao isolamento social, na contramão dos principais líderes mundiais; negou a dimensão das queimadas que afetam o Pantanal e a Amazônia; e acusou estrangeiros de promoverem campanha de desinformação sobre temas com interesses obscuros. Os dados sobre a ruína no Pantanal e na Amazônia vêm da Nasa e do Inpe. Até setembro de 2020, o fogo já consumiu 25% do bioma do Pantanal, conforme relatório da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ.

A gestão da crise do covid-19 é um desastre em todos os aspectos, cujos mais de 140 mil mortos falam por si. Bolsonaro isenta-se de qualquer responsabilidade no que diz respeito à doença e a seus efeitos econômicos e sociais. E pasmos, percebe-se que o aumento da sua popularidade é irresponsabilidade de brasileiros que vivem no ‘mundo de fantasias’. Apoiou o uso ineficaz da cloroquina, e disse que “quem ficou no isolamento na pandemia é fraco e se acovardou”. Tal irresponsabilidade do presidente rendeu-lhe apoio entre brasileiros incapazes, por diversas razões, de enxergar além de seus estreitos horizontes pessoais.

É não se importar com milhares de pais, mães, pais, irmãos e avós que morreram em decorrência do negacionismo pandêmico; que as principais reservas ambientais do país estejam ardendo por omissão do governo; que os povos indígenas estejam correndo risco de extinção. Eximiu-se de qualquer responsabilidade pelo número de mortos pelo covid-19 no Brasil. Falseou números do auxílio emergencial. Disse que combateu o coronavírus e colocou a culpa nos governadores e prefeitos. Imersos em uma fantasia corporativa, o governo propaga que o problema da imagem do Brasil se combate com propaganda, mantendo o país afastado de qualquer possibilidade de ser respeitado e manter um mínimo de credibilidade.

No seu discurso, Bolsonaro descreveu um país imaginário: afirmou que não faltam hospitais e meios para atender aos pacientes da covid-19, que há alta de investimento estrangeiro no Brasil e que mantém uma política de tolerância zero com o crime ambiental. Disse que é vítima da investida de inimigos a serem combatidos. Espalhou teorias da conspiração e propagou inverdades já contraditas. Repleto de fantasias sobre o sucesso do seu governo, elogiou descaradamente Trump, entrando na campanha da eleição americana e atacou a Venezuela. Fortemente contaminado por um lado pela histeria ideológica, gritou: “Brasil acima de tudo!”. Pergunta-se: qual Brasil, porque este Brasil está queimando, morrendo de covid-19, e com mais de 10 milhões de brasileiros passando fome?